sexta-feira, 29 de dezembro de 2006

fonte: www.outernative.net
por Bruno Reis

Volver
Pedro Almodóvar
Espanha 2006


As criações de Almodóvar são sempre bastante originais. Personagens fantásticos, tramas rocambolescas que se desenvolvem e se resolvem com facilidade impressionante, uma riqueza no trato com a imagem, em ângulos, texturas e cores ao mesmo tempo surpreendentes e simples - tudo criado e retratado com extrema originalidade. Mas há algo fincado no coração dos filmes do diretor espanhol, algo que independe de tudo que já foi citado acima: a redenção de suas personagens.

Não importa quão tortuoso seja o caminho que os protagonistas tenham que percorrer, eles o fazem com a graça e a bravura costumeira das personagens que saem da cabeça de Almodóvar. Em "Volver", esta redenção, esta volta por cima, está presente em todo o longa, em todas as mulheres que desfilam frente à câmera. Cada uma a sua maneira, elas vão destrinchando a vida que lhes é concedida ao ritmo de todas as dificuldades que vencem e todas as derrotas que lhes são impostas - mas sem perder a ternura.

Exposta no título do longa (volver significa voltar em espanhol, pra ficar claro) e concentrada em Raimunda (a bela e talentosa Penélope Cruz) e Irene (Carmen Maura, ótima), esta busca pelo retorno de dias melhores acaba direcionando a história, guiando a trama principal e as subtramas que se apresentam ao longo do filme. "Volver" traz Almodóvar como não se via desde "Tudo Sobre Minha Mãe", inflado de grandes idéias, discorrendo sobre tudo com seu humor ácido e ligeiro, com suas personagens corajosas e sofridas lutando por uma vida digna, por entendimento, por perdão.

Raimunda e Sole (Lola Dueñas) são irmãs, órfãs após a morte de seus pais em um incêndio na vila onde moravam. Agora radicadas em Madri, as duas seguem vidas opostas: Sole está divorciada, mas mantém um salão em sua casa e procura voltar a ter uma vida normal; Raimunda tem um marido desempregado e folgado, uma filha adolescente que vive no celular com as amigas e trabalha sem parar para manter a família. Mas essa aparente normalidade é quebrada com acontecimentos familiares como a trágica morte do marido de Raimunda e de uma tia, além das aparições da falecida Irene, mãe das duas irmãs. De uma hora para outra tudo se transforma, e a história ganha contornos sinistros.

Como não poderia deixar de ser em se tratando de Almodóvar, o longa é concentrado nas mulheres. O cinema do diretor espanhol tem essa caracterítisca, e não é de hoje. Em "Volver" isso é intensificado de uma forma agônica, ao ponto de causar estranheza toda vez que um homem aparece na tela. Seja ele bem intencionado, seja apenas por telefone, seja no meio de um funeral, a presença masculina é tida quase como uma aberração. Desta forma, a concentração no universo feminino se torna tão forte que por vezes esquecemos que Sole é divorciada (seu ex-marido não aparece e quase não é citado) ou que as irmãs tinham um pai (que, apesar de ter papel importante na trama, pouco é citado e também não dá as caras). Até o marido de Raimunda não chega a durar muito tempo no mundo dos vivos.

Todas as mulheres do filme sobrevivem bem sem a presença masculina, mesmo após a perda no caso de Raimunda e sua filha, e potencializam assim um sentimento "almodovariano" de que o mundo seria muito mais feliz sem os homens (no caso, ele se refere aos homens que fazem questão da masculinidade exacerbada e da ignorância machista). "Volver" acaba desenvolvendo uma linha de raciocínio que traça paralelos com as mudanças de humor e de sentimentos femininos, de modo a nos colocar em perfeita conexão com os terjeitos e maneirismos femininos.

A trama à primeira vista intrincada de "Volver" se resolve de forma tão natural e sensível que é impossível não elogiar a classe de Almodóvar, que trata suas histórias com inteligência e sensibilidade que não se costuma ver todo dia no cinema. Nunca duvidando da esperteza do seu espectador, o espanhol prefere jogar respeitosamente com ele, apresentando subtramas como a "aquisição" do restaurante por Raimunda e a doença de Agustina, que ao final de tudo se encaixam com perfeição à idéia geral. Para completar, Almodóvar ainda mostra sua capacidade de emocionar com momentos tão bacanas e tão distintos como a canção que Raimunda canta no restaurante e a conversa pontuada pela trilha de suspense entre a personagem de Penélope Cruz e sua filha, logo após a morte do pai da garota. Pequenas pérolas.

"Volver" é daqueles filmes que gera vários dentro de si mesmo, com diversos estilos e gêneros se encontrando cena a cena, e casando cada um deles com a perfeição do estilo de Almodóvar, um cineasta inconfundível, seja na forma de mostrar o mundo com o qual se identifica, seja na temática redentora. Um cinema que expõe com tamanha maestria a personalidade fantástica de seu criador tem grandes chances de triunfar - e "Volver" triunfa, inquestionável, como uma obra que vai atravessar o tempo. Merece cada letra dos costumeiros créditos "Un film de Almodóvar".

o dia q eu assisti esse filme foi uma overdose de Almodóvar lembra Cássio??
+ depois da "lotada" estréia de Volver no Catuaí sai com a certeza que precisava mesmo conhecer mais de Almodóvar e principalmente "Fale com ela" e "Tudo sobre minha mãe" q já foram mais que recomendados.
já faz tanto tempo...

2 comentários:

CassiO disse...

E como não iria lembrar! A reaparição da irmã Rata e tudo mais! E quem não lembraria de um filme com a Penélope Cruz?! hehehehe

Diz ae, esses outros nomes do Almodóvar são pro calendário de 2007 do Cineclube XIII de Novembro?

emilio_ disse...

com ctz ciclo almodóvar pro primeiro semestre ainda!